Mato Grosso, 26 de Abril de 2024
Esportes

Dicionário Micale: a procura do ouro traz um novo jeito de falar de futebol

22.07.2016
09:20
FONTE: Alexandre Lozetti, Felipe Schmidt e Raphael Zarko, em Teresópolis, Rio de Janeiro

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No um contra um, Garrincha era inigualável! A seleção brasileira de 1970, de Pelé, Tostão, Jairzinho e companhia ilimitada era um time que gostava e só sabia propor o jogo. Bellini e Brito não se arriscavam em de ligações diretas. Tinham no meio dois facilitadores, Didi e Gerson. Zagallo, estrategista desde os tempos de jogador, era o homem da transição ofensiva, mas também era brilhante na recomposição.

Tudo bem, a linguagem talvez não fosse – e não era – a mais apropriada para os tempos idos de times campeões do mundo. O novo dicionário do futebol brasileiro – futebol moderno se preferir – divide gerações e opiniões. Os mais antigos – conservadores, melhor dizendo -, ainda são adeptos da defesa que joga "com a bunda lá atrás" – nada de marcação baixa ou alta. E as tais linhas compactas, a grosso modo – e que nos perdoe os modernistas – não passam da evolução do “maré, maré, jacaré, jacaré” tão decantado. Atacam 11, defendem 11. Exatamente como você ouve e lê em quase todo fim de semana nos preparativos para cada partida de futebol profissional.
 
Um dos adeptos dessa nova linguagem do futebol é o treinador Rogério Micale, técnico da seleção olímpica. Em Teresópolis, ele leva os conceitos mais atualizados do futebol nacional e europeu – com grande influência de teóricos portugueses – para a base brasileira. Micale representa a renovação de professores e também parte da renovação do vocabulário. O GloboEsporte.com traz a versão esportiva do dicionário Micale – inspirada no Michaellis -, que pode ser conferida na nova safra de competentes treinadores. De Fernando Diniz a Milton Mendes, passando por Dorival Júnior até Tite.
 
Extremos – Vamos no popular. Um extremo nada mais é do que um ponta. Lembra do Jô Soares dizendo “bota o ponta, Telê”? Talvez não tenha idade suficiente para isso, mas hoje o ponta é um pouco diferente, é verdade. Eles voltam o campo todo para marcar, acompanham laterais e precisam apoiar o ataque, subir com força para o um contra um. Hein?
Um contra um – Sigamos na simplificação dessa linguagem. Que ninguém nos leve a mal. “Um contra um” também atende pelo nome de “mano a mano”. Para ir mais longe, um jogador bom no um contra um é... por que não?... ensaboado. Liso. Enjoado. Um azougue! Ou seja, ele é muito bom para se livrar do adversário. Ele dribla com enorme facilidade. Lembra Galvão na Copa de 1994 quando Romário saía em disparada contra suecos e italianos? “Quero ver segurar o Baixinho!” Pois é. Ele era terrível no um contra um.
 
Ligação direta – Essa você escuta a cada coletiva de imprensa. E temos certeza também que lê um pouco por aí em textos de jornalistas e experts de forma geral – às vezes a variação é mínima entre os dois grupos. Aquele chute forte que atravessa o campo e procura o campo de ataque, que ignora a passagem pelas laterais e os meias. Sabe? Não tem mais aquela antiga fama de chutão. Mas também não é lançamento. É uma ligação direta.
 
Dar liga – É aquele time que encaixou, que vai dar o que falar, que joga por música, diriam os mais românticos. Os jogadores estão entrosados, os passes saem sem os companheiros olharem uns os outros. O técnico nem perde a voz na beira do campo.
 
Propor o jogo – Da mesma família do “protagonista”, que chegou ao grande público na gestão Mano Menezes na seleção brasileira. O time que propõe o jogo fica mais com a bola, tenta tomar a iniciativa. Tem uns 60% do tempo a bola no pé, não fica esperando o adversário. O contrário do time do time que propõe o jogo é aquela equipe que tem outra “proposta de jogo”. O que em outros tempos poderia ser chamada apenas de ferrolho, retranca. Aquele time que “defende como time pequeno”. O que é expressão antiga meio sem sentido – afinal, o time que sabe se defender pouco leva gol e não deve ser pequeno, certo?!
 
Último terço – A medida do campo de futebol, na média, hoje é menor. Já foi de 110m x 75m, hoje são 105m x 68m. O último terço fica mais ou menos entre a intermediária – palavra em desuso no futebol atual – e a linha de fundo. Nesses últimos 20 e tantos metros até o gol adversário, os jogadores podem abusar do um contra um, das triangulações, do jogo criativo. Tudo para iludir o adversário, entrar na área e marcar o gol.
 
Pé invertido – Não é folclore, não é Curupira. O jogador que atua com o pé invertido é um destro atuando pelo lado esquerdo, e vice-versa. Exemplo dos anos 1980 é o maestro Junior, que ganhou tudo pelo Flamengo como lateral-esquerdo destro. Na seleção olímpica há o santista Zeca, com a mesma facilidade.
 
Transição ofensiva – Saída da defesa para o ataque. Com inteligência na troca de passes, muita movimentação, jogadores avançando em boa coordenação, sendo apoiados por outros que vêm de trás. É o momento em que o time se reorganiza para atacar... Ou pode ser qualidade de um jogador, que faz boa transição ofensiva. Um jogador que tenha função de marcador no meio de campo e que sai com desenvoltura para apoiar o ataque.
 
Compactação e as linhas – É comum na TV, que cada vez mais investe em análise tática – o que é ótimo e enriquecedor -, e também nos sites e blogs certa dissecação sobre a arrumação tática do time. Os jogadores formam um 4-1-4-1, com quatro defensores, um volantão mais marcador, quatro meias, que podem ser dois meias de origem, mais dois atacantes nas “extremas”, e um centroavante mais isolado. Esse desenho imaginário forma linhas. Esse bom agrupamento, sem permitir espaços entre os setores de um time – pense num desfile de escola de samba que não pode perder ponto na Evolução e faz aquele recuo de bateria perfeito -, mostra a boa compactação do time, a sincronia das linhas. Jogadores atuando próximos podem avançar em cima de um adversário solitário, dificultar tabelas e roubar a bola.
 
Linha alta – O Neuer do Bayern de Munique e da Alemanha é a última peça de uma defesa em linhas altas, que faz a marcação mais avançada. Zagueiros que atuam logo atrás dos meias, quase na linha que separa os dois lados do campo. A marcação alta veio para ficar em times brasileiros. Cada vez mais os defensores devem saber jogar melhor com a bola nos pés para auxiliar a saída de bola, o início das jogadas. E devem ser velozes também para qualquer imprevisto. Porque o campo que fica atrás dele, consequentemente, é bem maior também.

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