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Após cirurgia inédita, menino que teve 45% do corpo queimado se recupera

25.04.2015
05:45
FONTE: G1

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  • Gustavo Kenedi e a professora Natalícia durante a aula
Gustavo Kenedi Sousa Bertelli, de 8 anos, é magrinho, quer ser policial quando crescer e, como a maioria das crianças, não gosta de injeções, muito menos as que toma para reduzir as cicatrizes na orelha. Mas isso não o impede de seguir à risca o tratamento indicado pelos médicos e de ser descrito de forma unânime por familiares e amigos como “forte”. Morador de Ibaté (SP), ele sofreu graves queimaduras na cabeça, pescoço, peito e braços em 2013, quando tinha 6 anos, e, em 2015, passou por uma cirurgia inédita, com uma placa especial de silicone, capaz de acelerar a recuperação e auxiliar na retomada de movimentos prejudicados após cicatrização inadequada.

O procedimento foi realizado no Hospital de Clínicas da Unicamp e aos poucos Gustavo está recuperando a rotina. Ele participa de sessões de fisioterapia e não pode ficar muito exposto ao sol, por conta da sensibilidade da pele, mas voltou para a escola e continua como o melhor jogador de fliperama da rua. Só falta empinar pipa, uma das brincadeiras preferidas, mas isso também deve ocorrer em breve, durante as férias.

“Ele não tinha mais o movimento do pescoço, mastigar estava difícil. Um médico da Santa Casa de Limeira falou do problema na cicatrização e da possibilidade da cirurgia em Campinas. Disse que ia ligar e ficamos esperando”, contou Fabrícia de Quadros Souza, mãe de Gustavo e de Pedro Lucas, de 3 anos.

A notícia da esperada ligação chegou por meio de uma vizinha. Em fevereiro, Gustavo foi submetido à cirurgia para a aplicação da matriz e, um mês depois, os médicos enxertaram a pele removida da cabeça para cobrir a área. “Já não tinha esperança. Falaram que, ao todo, custaria R$ 80 mil. De onde ia tirar R$ 80 mil?”, disse Fabrícia. “Eu fiquei muito contente porque se coçava muito, não dormia direito, agora pode andar de pescoço erguido, era o que a gente estava esperando”, detalhou a avó, Roseli de Quadros.

O material utilizado, desenvolvido nos Estados Unidos, foi doado após uma uma negociação com a empresa distribuidora e, com a cirurgia, veio a esperança da recuperação. Na época, Paulo Kharmandayan, chefe da cirurgia plástica do HC e professor da Unicamp, explicou que o queixo de Gustavo estava colado ao tórax e que isso poderia prejudicar a alimentação, a respiração e o desenvolvimento cervical com o tempo. "A equipe que atendeu o Gustavo é de primeira. Os médicos me explicaram tudo, mostraram fotos, foram atenciosos", elogiou a mãe.

Acidente

Fabrícia trabalhava como cortadora de frios em um supermercado de São Carlos e o marido, transferido pela empresa, atuava como soldador na Bahia na época do acidente que deixou Gustavo com 45% do corpo queimado. “Eu havia acabado de chegar e ele pediu para ir à tia ver um filme. Dez minutos depois, ouvi o choro dele e ainda comentei com a minha mãe. Minha cunhada estava no banho e ele ficou sozinho com dois primos”, disse Fabrícia. As crianças jogaram álcool em Gustavo e atearam fogo.

“Ele estava usando uma blusa preta e quando vi só havia a parte de trás. Um vizinho ajudou e levou para o pronto-socorro aqui em Ibaté. Depois, mandaram ele para a UTI da Santa Casa de São Carlos e, de lá, conseguiram vaga em Limeira, onde passou dois meses e quatro dias”, disse a mãe.

Fabrícia e Roseli se revezavam no hospital a cada três dias. O pai de Gustavo, Paulo, deixou o serviço e também entrou no esquema. Eles viajavam de Ibaté a Limeira em um veículo da Prefeitura e passavam a noite na cadeira de acompanhante. Viveram assim de setembro a novembro de 2013, enquanto eram realizados enxertos de pele das costas e das pernas de Gustavo nas áreas queimadas e enquanto ele recuperava os movimentos após a retirada das faixas. “Ele viveu de novo, renasceu”, resumiu a avó.

Tia de Gustavo, Camila de Quadros Souza acompanhou a recuperação e contou que o momento mais difícil foi a internação na UTI. “A Fabrícia mandou uma foto pelo celular”, afirmou. Questionada sobre o que fez com a imagem, foi direta. “Tristeza a gente apaga, tem que apagar”.

Rotina

A comerciante Helena Aparecida de Souza tem uma lanchonete na rua da família e também conhece a história de Gustavo de perto. “Ele é meu amigo, falava que tinha dó de me ver sozinha, ficava aqui na loja comigo”, disse enquanto ele e os primos se divertiam no fliperama do estabelecimento.

Helena vende as pipas que fazem a cabeça da garotada durante as férias, mas, ao contrário dos papagaios, a máquina não sai de moda e, segundo as crianças, Gustavo é o melhor nas disputas com fichas. O segredo dele para se dar bem nas lutas? “Para ganhar, tem que dar o máximo”.

“Ele faz tudo o que os médicos mandam, é o esforço dele. Os médicos falam que ele é muito forte, muito guerreiro”, disse Fabrícia, sem esconder o orgulho. “Quando ele acordou da cirurgia, perguntou o que tinha no pescoço”, contou a mãe, e não foi o único questionamento. “Perguntei se ia vir comida”, contou Gustavo envergonhado.

Ele adora arroz, feijão e linguiça e, antes de ir para a escola municipal Professora Brasilina Teixeira Ianoni com os primos, mostrou que era bom de garfo. “Ele chegou mais magrinho, está engordando”, dedurou a tia.

Escola

Há uma prática de controle de presença na escola e não demorou para a direção perceber a ausência de Gustavo depois do acidente. “Após três dias de falta, entramos em contato com a família e, se não conseguimos fazer isso por telefone, vamos até a residência da criança”, explicou a diretora, Tânia Picinin.

Ele se afastou da escola em setembro de 2013 e só voltou a frequentar as aulas com regularidade no segundo semestre de 2014. Tinha vergonha dos olhares, das perguntas, não queria regressar e foi necessário um trabalho conjunto de incentivo. De início, foi criada uma pasta com atividades que Gustavo havia perdido e as crianças da sala foram informadas que ele havia sofrido um acidente. Se ele dizia que não estava bem, a equipe avaliava a necessidade de permanecer na escola naquele dia e avisava a mãe.

“As crianças encararam como normal, entenderam que tinham que cuidar dele. Foi aos poucos, havia a insegurança dele e da própria Fabrícia. Mostramos que a gente podia cuidar dele”, comentou Tânia. Mãe de dois meninos, inclusive de um Gustavo, ela contou que se colocava no lugar do aluno e que percebeu melhoras depois do procedimento em Campinas.

“Antes, ele ficava escondendo o pescoço e eu trouxe camisas de gola alta do meu Gustavo para ele se sentir mais confortável. Agora, depois dessa cirurgia, ele brinca, interage”, disse a diretora. Mas ainda há restrições, principalmente na educação física. “Ele fica na sala, para leitura e atividades teóricas, brinca com jogos de tabuleiro com os colegas e, quando quer, deixamos assistir aos exercícios”, explicou o coordenador da disciplina, Alexandre Gaspar.

 Segundo Gaspar e Tânia, o caso de Gustavo não foi o primeiro na escola e, por conta dos riscos, a direção pediu ajuda ao Corpo de Bombeiros e a unidade sediou uma palestra sobre acidentes domésticos e primeiros socorros. “Um aluno tentou fazer um carrinho com uma garrafa de álcool e, quando furou a embalagem com fósforo para colocar as rodas, se queimou. Também tivemos um estudante que queimou o rosto porque o irmão derrubou a panela com miojo”, relatou a diretora.

O caso de Gustavo, porém, foi o mais grave, daí a felicidade com a recuperação. “Ele perdeu conteúdo e tem dificuldade, mas faz os exercícios com a ajuda da mãe, participa, tem vontade de aprender. É muito forte”, afirmou a professora Natalícia Costa. “Ele quis a melhora e hoje a gente olha e fala: Como foi forte!”, completou Tânia.

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