Mato Grosso, 29 de Março de 2024
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Desabrigados se negam a mudar para barracas por causa de calor, em RO

08.04.2014
17:14
FONTE: G1

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Por conta da maior enchente já registrada em Rondônia, cerca de 25 mil pessoas foram atingidas e estão espalhadas entre abrigos, escolas e casas de parentes e amigos. O governo federal cedeu 500 barracas de lonas para os desalojados se mudarem mas, alegando calor intenso, as famílias desabrigadas pela enchente não querem ir para esse abrigo único, que fica no Parque de Exposições de Porto Velho.

De acordo com o coronel Demargli Farias, da Defesa Civil, o abrigo único servirá para centralizar toda a ação que deve ser feita com as famílias desabrigadas. “Vai ser um local de um grande acampamento com assistência para todas as famílias.”, diz o coronel. No entanto, as familias afirmam que estão em melhores condições nos abrigos improvisados em que estão vivendo.

Várias escolas da rede pública de ensino de Porto Velho estavam servindo de alojamento para as familias desalojadas, mas, por conta da necessidade da retomada das aulas, foi criada essa alternativa de moradia para os atingidos pela cheia do Rio Madeira.

Na Escola Orlando Freire, Zona Leste de Porto Velho, 32 famílias do Distrito de São Carlos, no Baixo Madeira, estão alojadas há cerca de dois meses. Em sua maioria, deixaram para traz, além da casa e a lavoura, eletrodomésticos, roupas e até documentos ao serem pegos de surpresa pelo aumento repentino do nível do Rio Madeira.

Sem ter onde morar e nem expectativa de retorno para o local de origem, estas famílias se recusam a deixar as escolas e se mudarem para as barracas de lona, enviadas pelo governo federal e que foram montadas no Parque de Exposições de Porto Velho. Levados para conhecer a estrutura, os desabrigados afirmam que o calor intenso é o principal motivo da negativa.

O casal Thamires Lagos e Dilson Oliveira se conheceram em uma viagem de barco pelo Rio Madeira. Ela de Manicoré (AM) e ele de São Carlos, onde viviam há 11 meses. Da união veio o pequeno Dilson Junior, de um mês, que nasceu enquanto a família já morava no abrigo, onde dividem uma sala com os pais e tios. Ao todo, três famílias dividindo o mesmo espaço que se recusam a ir para as barracas. "Aqui já é quente, ele [o bebê] quase não dorme durante o dia, fica agitado. Lá vai ser muito pior", diz Thamires. Ao todo, 1,5 mil famílias deveriam ser transferidas para o abrigo unico em uma estrutura com, além das barracas de lona, cozinha e banheiros coletivos.

Assim como Dilson e Thamires, a maioria das famílias da comunidade vivia da pesca e da agricultura. Acostumados ao contato direto com a natureza, a nova realidade, cercada de muros, sem trabalho e previsão de retorno às antigas casas, assusta. "Nasci e me criei na beira do rio, isso aqui, para mim, é uma doença, não é o meu lugar", diz Elias Passos Ribeiro, de 71 anos, 40 destes como pescador. Ele, a esposa, Hosana de Lima, e o filho, Jonas Elias, tiveram que deixar a casa onde viviam às pressas. Apenas alguns documentos e as malhadeiras (redes utilizadas na pesca) foram salvas.

Vivendo alojado, Elias diz que os dias são de inquietação, sem ter o que fazer e nem para onde ir. "Aqui na cidade nem o vento é o mesmo", conta. Sobre mudar para as barracas de lona ele é enfático. "Não gosto nem de pensar. Não vou, não", diz. Ele também participou do protesto na manhã desta terça-feira (8) contra a tranferência dos desabrigados.

Cardíaca e hipertensa, a esposa de Elias afirma que seria impossível viver nas barracas sob o calor intenso e que só deixará a escola se for para um lugar melhor. "Você acha que tem a possibilidade de um ser humano aguentar?", indaga Hosana.

Sobra a volta pra casa, a família diz que para a antiga moradia será impossível. "O Rio trouxe terra, cobriu nossas casas, se transformou em uma praia, não dá para voltar", diz Elias. A esperança é a construção de uma nova São Carlos, ainda às margens do rio, porém em uma área mais alta, que não foi atingida. A possibilidade de uma casa na área urbana de porto velho é descartada. "Nós não vamos nos adaptar aqui. Nosso mundo é diferente, é um mundo tranquilo, a gente dorme de portas e janelas abertas. Aqui [abrigo], depois que nós chegamos, todo dia é alguém doente", revela Hosana.

Em Porto Velho, cerca de 8 mil estudantes da rede estadual estão sem aulas, por conta das salas ocupadas pelas famílias.  A Secretaria Estadual de Educação (Seduc) afirma que de 92 escolas estaduais, oito foram cedidas para abrigos e estão com o período letivo suspenso há dois meses.Os alunos de São Carlos também estão sem aula. "Eu sei que aqui as crianças também estão prejudicadas, mas nossos filhos também, e não é culpa nossa. Não é a nossa intenção prejudicar a eles, mas também precisamos de um lugar para ficar", finaliza Hosana.

Isaac dos Santos, morador do distrito há cinco anos, tinha na pesca e na produção de açaí a principal fonte de renda. Pais de 4 filhos, dois ainda moravam em casa, um de 12 e outro de 15 anos, que também estão sem estudar. A família também perdeu todos os pertences, além do canil onde ele abrigava animais abandonados.

 "Minha prioridade foi resgatar os animais, mas o resto perdi tudo", conta. Segundo ele, a mudança fez com que desenvolvesse problemas de sáude, como hipertensão, e também emocionais. "Vivo a base de medicamentos", completa.

Na escola onde a família está abrigada, as aulas do terceiro ano do ensino médio foram mantidas. Situação, que segundo o morador, é difícil para as duas partes. "É ruim para os dois [estudantes e desabrigados], os dois estão sufocados", conta. Entretanto, a mudança para as barracas de lona seria, para ele, uma "missão impossível". Isaac também chegou a estrutura montada no parque de exposições. "Quem está lá, fala que está passando mal, não dá para suportar o calor, a temperatura é muito alta", afirma.

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