Mato Grosso, 20 de Abril de 2024
Agro

Como tem sido a Revisão de Contratos Futuros?

07.08.2022

IMPRIMA ESSA NOTÍCIA ENVIE PARA UM AMIGO

  • Foto: Arquivo Pessoal

O agronegócio é uma cadeia produtiva interligada por etapas consecutivas que unem o produto do campo até o seu destino final, seja no mercado interno ou externo.

 

Entre tantas etapas do planejamento, a colheita e entrega de grãos, muitos fatores externos podem traduzir aos produtos elencados perigosas oscilações de preço que podem comprometer todo o ano comercial dos produtores.

 

É por isso, que muitos produtores tentam se proteger vendendo antecipadamente suas lavouras garantindo preço certo para seus produtos.

 

Farei aqui, análise dos princípios de validade geral dos contratos de fixação de preço, suas características fundamentais e o cabimento ou não das principais teses enfrentadas pelo judiciário na análise de casos evolvendo tais pactos. 

 

A chave principal é a possibilidade ou não da rescisão de contrato de compra e venda de produtos agrícolas com base em onerosidade excessiva, derivada de um aumento de preço do produto ocorrido entre a data do contrato e o momento do cumprimento da obrigação e entrega da commoditie.

 

Essas discussões chegam todos os dias a porta do judiciário buscando guarida a teses diversas, especialmente envolvendo: onerosidade excessiva, a imprevisão e o enriquecimento sem causa.

 

Com a tentativa do melhor debate, passarei ao breve estudo individual de tais teorias tentando esclarecer sua utilização ou não aos contratos futuros de compra e venda de grãos frente ao aumento inesperado de preço de tais produtos. 

 

Onerosidade Excessiva:

A possibilidade de Revisão contratual justificada pela onerosidade excessiva, encontra amparo no artigo 157 do Código Civil. O Ilustre parecerista Silvio Rodrigues, a respeito do tema, assim lecionou: 

“A primeira e principal asserção a respeito desse tema é a de que só são suscetíveis de resolução, por onerosidade excessiva, os contratos comutativos. Quando se fala nessa espécie de contratos, têm-se que considerar que ela se opõe aos contratos aleatórios, onde por definição mesmo, as pretensões não são ou podem não ser equilibradas.”

 

Permitam-me ser mais técnica nesse momento, e descrever a diferença entre contrato comutativo e contrato aleatório. Na sequência, voltamos a leitura mais leve. Aleatório é o contrato bilateral e oneroso em que pelo menos uma das partes não pode antecipar o montante da prestação que receberá, em troca do que fornece. Compra-se um risco, como no exemplo do seguro. Comutativo é o contrato bilateral e oneroso, no qual a estimativa da prestação a ser recebida por qualquer das partes pode ser efetuada no mesmo ato em que o contrato se aperfeiçoa. Assim, por exemplo, a locação de coisa.

 

Feita a distinção entre os conceitos, vê se que a ideia de comutatividade se insere a casos em que há equivalência de prestações, pois é normal que em pactos com fins lucrativos, cada parte só consinta em um sacrifício se aquilo obtiver em troca lhe for equivalente.

 

Nos casos dos contratos futuros de compra e venda de grãos, a compra e venda se aperfeiçoa antes mesmo do plantio, caracterizando-se, por conseguinte, em legítimos contratos aleatórios, onde o produtor, se nada colher, nada em troca receberá.

 

Além disso, somente será admitida diante da superveniência de prestação tornada excessivamente onerosa a uma parte e extremamente vantajosa à outra, ou seja, não basta ser apenas onerosa, deve-se comprovar que tal prestação implica automaticamente em grande vantagem à outra parte em desequilíbrio contratual patente.

 

Não podemos deixar de citar, e inevitavelmente, ser técnica novamente, o princípio da obrigatoriedade dos contratos ou Pacta Sunt Servanda, que se alicerça em outros três princípios não menos importantes à formação de contrato: autonomia de vontade, apenas limitado à supremacia da ordem; o princípio da relatividade das convenções e; o princípio da força vinculante, também conhecido como princípio da obrigatoriedade das convenções. 

 

A somatória de todos esses princípios consagra a ideia de que o contrato faz lei entre as partes.

 

E compactuando com o parecer de Silvio Rodrigues, a onerosidade excessiva não é argumento para contrato de compra e venda de commodities, por se tratar de contrato aleatório, salvo melhor juízo e análise do caso concreto, a estes casos de maneira geral.

 

Teoria da Imprevisão:

A teoria da imprevisão surgiu durante a Primeira Guerra Mundial. E no nosso ordenamento, o Código Civil trouxe menção no artigo 317, que afirma: 

317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

 

No caso dos contratos futuros de compra e venda de commodities o STJ – Superior Tribunal de Justiça, entende por impraticável tal teoria sob o ponto de vista geral, uma vez que a oscilação de preços dos produtos agrícolas é fato considerado normal e corriqueiro, para o tribunal, a justificativa está no fato dos produtores rurais procurarem as tradings e cerealistas todos os anos para se proteger de tais oscilações quando sentem que determinado preço, se fixado, lhes garantirá lucro razoável. 

 

Enriquecimento sem causa:

Esse argumento é outro ponto frágil, também já analisado pelo STJ, que afirmaram em diversas decisões que não pode haver enriquecimento sem causa em contratos futuros pois esta teoria pressupõe o enriquecimento de uma parte diante do empobrecimento de outra motivado pela mesma circunstância.

 

As decisões mantiveram-se pautadas, que pode até ocorrer de maneira geral a oscilação dos preços, mas o produtor rural calcula previamente seus custos e sua margem de lucro; já as empresas compradoras de commodities também não se arriscam ao travar o preço com certa margem de lucro justamente para, concomitantemente ao produtor, não se arriscar a comprar o produto por um preço maior e vende-lo a um preço menor.

 

Concluo, que poderá sim haver revisão ou resolução de contratos futuros de compra e venda de produtos agrícolas, mas não, de maneira geral, lastreando-se tais decisões nas teorias da onerosidade excessiva, da imprevisão e do enriquecimento sem causa, por se tratar de pacto de risco absolutamente previsível às partes acostumadas às características de inconstância da agricultura no tocante à oscilação de preços decorrentes de fatores diversos, tais como clima e demanda. 

 

* Por Adryeli Costa – Advogada

 

IMPRIMA ESSA NOTÍCIA ENVIE PARA UM AMIGO

ARTIGOS RELACIONADOS

ENVIE SEU COMENTÁRIO